Cidade da Praia, 14 Jul (Inforpress) – O sector da construção civil em Cabo Verde tem enfrentado grandes desafios e concorrência desleal, segundo declarações de um empresário do ramo, que preferiu não ser identificado, mas a Ordem dos Engenheiros fala em retoma do dinamismo.
Em declarações à Inforpress, um empresário do sector da construção civil em Cabo Verde revelou a “difícil situação” enfrentada pelas empresas do ramo e ressaltou que a falta de grandes obras, aliada a exigências financeiras além da capacidade nacional tem prejudicado, consideravelmente, o sector.
Segundo disse, a falta de regulamentação e protecção ao mercado nacional tem contribuído para a predominância de empreiteiros estrangeiros em detrimento das empresas locais. Este ainda destacou a necessidade de criar condições favoráveis para que as empresas nacionais possam competir em igualdade de condições. Além disso, ressaltou a preocupação de que os investimentos públicos e financiamentos estrangeiros acabam sendo custeados pelos próprios cabo-verdianos.
“Enquanto o nosso mercado não for devidamente regulado e blindado, e defendermos o espaço das empresas nacionais, criando condições para nós operarmos, ficaremos assim. Adicionalmente, por isso, as empresas nacionais, mais rapidamente, juntam-se a uma estrangeira do que a outra nacional. A união faria a força e esquecem-se todos que o investimento público ou os financiamentos estrangeiros, são os cabo-verdianos a pagarem sempre”, disse.
Questionado sobre a melhoria da situação após a pandemia, o empresário afirmou que houve “uma lenta recuperação” e que a demanda ainda é insuficiente para suprir as necessidades do sector.
“Tem vindo a pretender melhorar, mas muito devagar, vai tardar a chegar. Basta verem os concursos lançados pelas principais entidades públicas, o nosso maior mercado, e constatamos fraca procura. O Sector Privado, além de desregulado, está muito abaixo do necessário. Não há obras para todos”, frisou.
Os preços dos materiais foram outro ponto abordado pelo empresário, que explicou que os preços aumentaram “significativamente”, sendo a guerra na Ucrânia um factor que impactou negativamente o mercado globalmente.
“Imagina, uma empresa que contratou uma obra com preços de 2020-2021, iniciar os trabalhos em 2022, o que isto tem sido. Trabalhar para receber abaixo do custo real e os Clientes Públicos, a “assobiarem” para o lado, amarrados numa lei muito deficiente neste aspecto. Não há revisão de preços, é uma ruína total”, continuou.
Sobre a concorrência desleal, o empresário destacou que ela ocorre principalmente nos municípios, onde muitas obras são executadas directamente ou por micro e pequenas empresas ineficazes e mencionou o aumento de empresas sem capacidade técnica ou financeira que praticam preços baixos, causando uma queda na contratação e produção.
“Com a atribuição ‘facilitada’ das licenças de operador da construção e dos Alvarás, houve um aumento exponencial de micro e pequenas empresas, sem capacidade técnica ou financeira, sem experiência, mas que com o dumping nos preços, têm causado uma quebra na contratação e na produção. Ou seja, no sector privado, executam as próprias obras, sem recorrer às empresas especializadas do sector, e no sector público conseguem as obras pelo preço mais barato. O que desvirtua todo o mercado”, reforçou.
Quando questionado sobre a fiscalização para combater a concorrência desleal, o empresário criticou a falta de controle e transparência, frisando a importância de uma fiscalização activa, com rigor e punições aos infractores, a fim de garantir a regulamentação do sector.
Em relação à concorrência estrangeira, o empresário ressaltou que ela é mais evidente em grandes projectos privados e em obras públicas financiadas por entidades externas. Segundo explicou, essas empresas estrangeiras possuem maior capacidade técnica e financeira, devido aos mercados em que operam, o que lhes confere vantagem competitiva. Além disso, acrescentou que “não são obrigadas a se associarem a empresas nacionais, o que dificulta a transferência de conhecimento para os profissionais locais”.
Quem também falou à Inforpress sobre o assunto foi o bastonário da Ordem dos Engenheiros de Cabo Verde, Carlos Alberto de Sousa Monteiro, que afirmou que não possui dados estatísticos actualizados sobre a dinâmica da construção civil, mas observou que o sector está retomando certo dinamismo tanto nos empreendimentos privados quanto nos do Estado.
Sobre a concorrência desleal, o bastonário mencionou a existência de empresas que actuam sem engenheiros qualificados, praticam preços muito baixos e não contam com acompanhamento técnico especializado.
“A concorrência desleal existe sempre. Algumas empresas actuam sem a presença de engenheiros, devidamente qualificados, praticam preços muito baixos, não têm seguimento de técnicos qualificados”, disse.
Em relação à fiscalização, o bastonário enfatizou a importância da colaboração entre várias entidades, como a Comissão de Alvarás, a Direcção Geral de Inspecção, as Câmaras Municipais, a Associação de Empreiteiros e a Ordem dos Engenheiros para combater a concorrência desleal de forma efectiva.
Quanto à concorrência estrangeira, o bastonário ressaltou a importância de exigir que os engenheiros envolvidos em projectos financiados por instituições internacionais estejam devidamente habilitados e inscritos na Ordem dos Engenheiros, enfatizando a necessidade de cumprir a legislação vigente para garantir um mercado mais controlado e regulamentado em termos de preços, prazos e qualidade.
“As entidades nacionais, responsáveis pelos concursos de projectos com financiamento do Banco Mundial, Banco Africano de Desenvolvimento ou outra instituição internacional, relativos a obras a serem realizadas em Cabo Verde, deveriam exigir que os engenheiros que vêem trabalhar nesses projectos de construção estejam habilitados no exercício da profissão em Cabo Verde ou seja, que estejam inscritos na OECV”, frisou.
Quando questionado sobre a linha de financiamento disponibilizada pelo Governo para ajudar as empresas, o bastonário sugeriu que essa questão seja discutida entre a Associação dos Empreiteiros e do Comércio, afirmando que a OECV estaria disponível para analisar e discutir as formas de canalização dos recursos financeiros disponibilizados pelo Governo.